domingo, 3 de agosto de 2008

BREVE HISTÓRIA DAS SALINAS DO MAIO (séculos. XV – XIX)

A rentabilização das salinas de Cabo Verde, e em particular as do Maio, nunca inspirou um excepcional interesse para os portugueses, devido à grande abundância de sal em Portugal, que já era explorado e exportado antes da sua nacionalidade. Em Portugal, encontram-se salinas no Rio Sado, nomeadamente em Setúbal e Alcácer do Sal, no Rio Tejo - as chamadas do Trancão e as de Alcochete - em Aveiro, Figueira da Foz, Tavira, Olhão, etc.!
Quando os portugueses identificaram e começaram a povoar as ilhas de Cabo Verde em 1460-62, depararam com mais daquele produto nas ilhas do Maio, Boavista, Sal, e até em Santiago, naturalmente não desenvolvendo particular interesse pela sua exploração. Isso não apenas por sobejar em Portugal, mas também porque significaria concorrência aos centros salíferos metropolitanos, mais acessíveis à demanda europeia.
Um factor que ampliou esta indiferença portuguesa pelo sal de Cabo Verde, foi a jurisdição administrativa estabelecida para o arquipélago. Logo em 1460-62 foi instituída para Cabo Verde aquilo a que se chamava de Donataria, autêntico domínio senhorial à maneira feudal. Na Donataria, alienava-se património da Coroa a um grande senhor, normalmente da Casa Real, o qual se constituía como figura que apenas tinha por impedimentos não poder cunhar moeda, não poder fazer declarações de guerra ou de paz, e não poder aplicar pena de morte ou de talhamento de membros; em tudo o mais tinha absolutos poderes na Donataria.
O Donatário tinha no entanto obrigações para com o Rei, porque não deixava de ser vassalo, o que para Cabo Verde se deveria traduzir em promover o seu povoamento e infra-estruturas. D. Fernando, primeiro donatário de Cabo Verde, apenas elegeu Santiago e Fogo para povoamento, onde concedeu terras para propriedade privada ou para usufruto de outros, mas todas as restantes ilhas eram espaço exclusivo da Donataria.
Isto significava que, se em Santiago e Fogo se constituíram terras de privados para ali deslocados, nas demais ilhas o dono estava ausente, vivendo na corte ou nos seus outros domínios de Portugal. Para este tipo de proprietário, a optimização dos seus rendimentos em Cabo Verde, passaria por um mínimo de deslocação de meios para o arquipélago, contra um máximo de lucros. Nesse sentido, para D. Fernando, explorar o sal da sua Donataria, implicaria a manutenção de toda uma logística que incluiria navios, infra-estruturas e servos, para colocar em Portugal um produto apenas rentável em grandes quantidades, e já excedentário!
A opção de D. Fernando foi antes largar gado nas suas ilhas, que se reproduziria, e que sazonalmente seria abatido para aproveitamento do couro, do sebo e da carne. Para a ilha do Maio esta intenção era ideal, porque a sua secura inviabilizava uma exploração agrícola expressiva, mas reunia boas condições para a pecuária extensiva, sobretudo de caprinos.
Foi assim que, a ilha do Maio se tornou uma ilha montado ou um curral! A courama - ou os couros - na época empregue nos mais diversos utensílios e não apenas no vestuário, era um produto com boa colocação em todos os mercados; o sebo era utilizado para sabão, mas também para o cordame dos navios; a carne salgava-se (chamada tchacina, é actualmente uma referência gastronómica no Maio) para abastecer os navios que passavam por Cabo Verde, transformado num importante porto de escala atlântico.
Nesta actividade, o sal do Maio era utilizado na carne e na secagem das peles, o que se constituiu no seu principal aproveitamento para os portugueses, dirigido não só ao gado do Maio mas também ao de outras ilhas.
Eventualmente, o sal maiense também serviu para troca directa no importante comércio que se desenvolveu entre Cabo Verde e a costa ocidental africana. Mas como já se disse, o sal é um produto rentável apenas em grandes quantidades, e naquelas paragens requeriam-se sobretudo cavalos e tecidos, em cuja produção Cabo Verde acabou por se especializar.
Ainda no séc. XVI, à revelia dos portugueses, os franceses também começaram a recolher o sal do Maio, anunciando a realidade que se definiria para esta exploração: em concreto uma promoção sobretudo estrangeira, associada a um quase conivente absentismo português!
O aparecimento dos franceses, relaciona-se com as alterações das conjunturas europeias desta época. Até princípios daquele século, os portugueses e espanhóis tinham liderado a chamada Expansão Europeia, tendo o seu ponto alto no Tratado de Tordesilhas, em 1494. Este Tratado viria a suscitar o comentário do jurista holandês, Hugo Grotius, que “portugueses e espanhóis não eram herdeiros de Adão e Eva”! Com efeito, era só uma questão de tempo para que outras potências europeias iniciassem as suas expansões, o que veio acontecer a partir de inícios do séc.XVI sobretudo através do envio de corsários, mas que depressa integraram acções mais assumidas de diversos estados europeus.
Esta alteração conjuntural europeia, foi determinante para que o desenvolvimento da exploração do sal cabo-verdiano fosse sobretudo protagonizado por estrangeiros, e não por portugueses, apesar de estes terem a soberania do arquipélago. Neste processo, surgiram primeiro franceses, mas depois ainda vieram holandeses e ingleses.
Os franceses, vieram para roubar os produtos presentes em Cabo Verde, entre eles o sal, mas o seu verdadeiro objectivo era usurpar a hegemonia comercial portuguesa na chamada Costa da Guiné - o que efectivamente fizeram – pelo que tiveram uma passagem relativa pela história da exploração salífera em Cabo Verde. No entanto, apesar de terem outras opções de salinas no arquipélago, revelaram uma predilecção pelas do Maio que não se alteraria com outros estrangeiros.
Esta preferência não se justificava pela eventual excelência do sal maiense, mas antes pela proximidade de Santiago, onde afluíam os barcos que comerciavam com a costa ocidental africana, ou vindos da Índia e Brasil. A ilha do Maio era estratégica para piratas e corsários se emboscarem, permitindo ainda a chamada aguada (abastecimento) devido à abundância de gado, e naturalmente a possibilidade de carregamentos de sal!
A sua presença no Maio foi tal, que em certa ocasião do séc. XVI, se chegaram aqui a contar quarenta e sete destes navios. Apesar de neste momento terem sido dispersos por naus vindas da Ribeira Grande em Santiago, a presença de piratas e corsários no Maio ao longo dos séculos (até com a honra dúbia da visita de Hawkins e Drake) teve quase absoluta impunidade.
Esta tranquilidade de circulação de estrangeiros pela ilha do Maio, destinada ao corso mas também à recolha de sal, resultou da conjugação de dois factores. Por um lado, como já se disse, o Donatário não accionou o povoamento desta nem de outras ilhas, promovendo o Maio apenas como ilha montado, o que não exigia a permanência de pessoas. Outro factor foi a crónica falta de meios dos portugueses para defenderem o seu imenso império, onde uma ilha deserta e com pouca expressão económica se tornava insignificante. O resultado foi que o Maio esteve até ao séc. XIX, praticamente despovoado e ignorado pelos portugueses.
Em finais do séc. XVI, princípios do XVII, os holandeses ganharam mais protagonismo que os franceses na exploração do sal do Maio, mais uma vez devido a alterações conjunturais na Europa.
Sucedeu que entre 1580 – 1640, Portugal perdeu a sua independência para a Espanha, devido ao rei português D. Sebastião, ter morrido sem deixar herdeiros! Na altura, as casas reais europeias tinham estreitas relações parentais, e acontecia que o primeiro na linha de sucessão deste malogrado rei português, era o Rei D. Filipe II de Espanha, que reclamou e assumiu a Coroa de Portugal.
Sucedia também, que Filipe II tinha a tutela dos Países Baixos - hoje designados por Holanda – mas estes estavam em revolta por motivos políticos e religiosos. Em consequência, os Países Baixos que se abasteciam de sal sobretudo em Setúbal, viram este acesso fechado quando Portugal se tornou domínio espanhol. A alternativa para os holandeses foi precisamente a ilha do Maio, onde ainda eram motivados pelos mesmos objectivos de corsários e piratas.
Sem haver precisão, o aparecimento de ingleses na exploração do sal do Maio, também deve datar desta altura e pelas mesmas razões. Portugueses e Ingleses gabam-se de terem a mais antiga aliança da Europa, que muitas vezes foi um precioso auxílio na oposição lusa aos castelhanos, mas a União Ibérica de 1580 invalidou essa aliança, porque os espanhóis também eram inimigos de Inglaterra nessa altura.
A diversidade de estrangeiros no Maio, sobretudo suscitada pela União Ibérica, trazia também a ameaça à soberania portuguesa no Maio e até talvez em todo o arquipélago, o que veio a ser um perigo para as salinas do Maio.
Para reagir a esta situação, impunham-se naturalmente medidas militares, que em Santiago se traduziram pela construção da fortaleza de S. Filipe, mas que para o Maio não passaram de intenções, mais uma vez por estarem comprometidas pela falta de meios materiais e humanos; bem como pela pouca importância da ilha face ao império, o qual agora reunia as possessões espanholas e portuguesas.
Para obstar a esta situação, instituiu-se no Maio um processo que funcionou com alguma eficácia em todo o Cabo Verde, os chamados facheiros que emitiam sinais de luzes com um facho, enviando mensagens dentro e entre ilhas sobre as armadas inimigas. Este sistema, que tinha por objectivo o resguardo das populações ou o pedido de auxílio, acabou por ser mais expressivo em relação à primeira intenção, porque para a segunda se requeriam os meios de que Cabo Verde carecia; ou que havendo implicavam uma mobilização morosa, na maior parte das vezes tardia.
Devido à impossibilidade duma eficácia militar, e porque a presença de estrangeiros no Maio aparentemente se devia ao sal, a partir de inícios do séc. XVII começou-se a formular a ideia de atulhamento ou assoreamento das suas salinas. Felizmente esta ideia não teve concretização, por um lado pelos meios consideráveis que envolveria, mas também porque implicaria o necessário assoreamento das salinas da Boavista e Sal, seguras alternativas para os abusadores.
Foi assim que, apesar da preocupação da tutela metropolitana, a exploração do sal do Maio foi impunemente feita sobretudo por estrangeiros, onde viriam a ganhar predominância os ingleses depois da Restauração da Independência Portuguesa, em 1640. Após este evento, a aliança com Inglaterra foi retomada, e esta nação veio mesmo a ter a posição de nação privilegiada nas relações internacionais portuguesas, sobretudo a partir de inícios do séc. XVIII.
Neste quadro, e pretendendo que o Maio fazia parte do dote da infanta portuguesa D. Catarina que se casou com o seu rei Calos II, os ingleses desenvolveram uma intensa e monopolizadora exploração do sal do Maio, declaradamente assumindo hegemonia na ilha. Daí, impediam outros países - incluindo Portugal e habitantes de Cabo Verde – de se abastecerem nas salinas, quando os seus navios estivessem a carregar. Na sua presunção, chegaram a intentar a construção de um forte no Maio.
Esta exploração inglesa relaciona-se com o seu porto de Guindaste, onde se chegaram a contar cento e dez navios de outras nacionalidades que ali se iam fornecer de sal. No Maio, a fabricação do sal era operada pelos próprios marinheiros e conduzido por moradores, que o levavam até à praia com animais, sendo o seu trabalho pago em produtos e menos por dinheiro.
Uma nova atitude da soberania portuguesa em relação ao Maio nesta altura, exprime a sua preocupação em relação a estes desenvolvimentos. Foi em finais do séc. XVII, princípios do XVIII, que o Maio finalmente deixou de ser Donataria revertendo para a Coroa, a qual para ali enviou um feitor e um vigário permanentes. Fracas atitudes no entanto, porque a irrisória população do Maio seria incapaz de se opor aos ingleses.
Na verdade, foi seguramente a movimentação inglesa na ilha – que significaria o incremento económico de locais - e talvez as preocupações de soberania portuguesa, que levaram a um tímido povoamento da ilha em princípios da centúria de oitocentos.
Com efeito, se para os séculos XV e XVI as referências são para o despovoamento da ilha, e em 1606 se contavam dez a doze pessoas que vendiam gado, no inicio do século XVIII já se indiciam sessenta pessoas directamente ligadas à exploração do sal, o que pressupõe mais população relacionada com outras actividades. De 1731, tem-se a informação concreta de que o Maio contava com quatrocentas pessoas.
No entanto, durante o séc. XVIII, se há referência de pessoas vinculadas ao sal – onde até se passaram a incluir o feitor e vigário – os seus proventos eram eventuais ou adicionais por serviço aos ingleses, enquanto o gado continuava a ser a principal fonte de rendimentos dos locais, que também já exploravam a agricultura, sobretudo na Ribeira de Stº António.
Durante o séc. XIX, a liderança inglesa na exploração salífera do Maio não se alterou, tendo até talvez recrudescido devido à sua prolongada hegemonia, que viu afastados potenciais concorrentes. Um deles foi o Brasil, que principiou a demandar o sal do Maio, mas acabou por abandonar essa procura.
Em conclusão, a exploração salífera do Maio foi eminentemente estrangeira tendo a certa altura hegemonia inglesa, e sem proventos expressivos para cabo-verdianos ou metropolitanos. Estes últimos, procuraram mesmo inviabilizar a sua promoção económica, para que não fizesse concorrência às salinas de Portugal.
À entrada do séc. XX, o constante monopólio salífero inglês no Maio, entrou no entanto em declínio. Uma das causas deve ter sido o ultimato de guerra que os ingleses impuseram aos portugueses em 1890, devido a questões territoriais em África, naturalmente arrefecendo as relações quase obsequiosas de portugueses para ingleses.

Por: Paulo Aníbal da Costa Santos

Livros consultados:

História Geral de Cabo Verde, coordenação de Luís de Albuquerque e Maria Emília Madeira Santos, III Vols.

Daniel A. Pereira, Estudos da História de Cabo Verde, Alfa – Comunicações,2ªed., Praia, 2005

Cap –Vert Aujourd`hui, direction de Michel Lesourd, Edition Jaguar

quarta-feira, 16 de julho de 2008

E a areia o mar levou( escadas de acesso à praia Bitchi rotcha

Cais "Velho"



Antes era aqui que desembarcavam os passageiros e as cargas de barco para a Ilha do Maio. A transferência era feita de bote. Actualmente ainda alguns pescadores o utilizam.

Igreja do Nazareno

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Kúlor Café



Excelente lugar para degustar algumas das mais saborosas iguarias da Ilha do Maio. O Chefe Sebastien consegue dar um toque a alguns pratos franceses, cabo-verdianos ou de "fusão". Carpaccio de poison; Tartare de poison; Gratin; Chili; Brochete; batatas salteadas; porc caramel; saladas; ... estas são algumas das opções possíveis de enumerar. Outras preferências podem ser dicutidas no local. As sugestões do Chefe serão apreciadas.

Contact (Sebastien) : + 238 9811303

sexta-feira, 4 de julho de 2008

quinta-feira, 3 de julho de 2008